APÓS A MORTE - CAPÍTULO 5

Tristeza, medo, desamparo, confusão. Foi isso que Lucas sentiu quando entrou na consciência do rapaz. O medo da morte era evidente. O jovem ceifeiro sentiu um pouco de pena daquele pobre homem, e acabou se lembrando que sentiu a mesma coisa quando estava a beira da morte.

Dentro daquele garoto tudo era diferente, nada se parecia com o que Lucas sentiu dentro da consciência de Judith. Naquela ocasião o anjo havia sentido paz, calma e alegria. Isso era devido às circunstâncias de cada morte. Judith estava pronta para morrer, na verdade ela almejava sua morte, estava em paz. Esse garoto era diferente, ele não estava pronto para partir. Mas havia mais uma diferença nessa ocasião, uma diferença fundamental: Aquele garoto não estava sozinho como Judith, havia alguém ali com ele.

“O anjo da guarda”.

Lucas sorri. Está feliz por aquele garoto não estar sozinho naquele momento. Mas Lucas sabe que tem uma missão a cumprir, e ele não pretende se intimidar com a presença de outro anjo. Ambos têm sua própria missão, e Lucas não tem a intensão de ser aquele que falhará.

O jovem ceifeiro agarra o fio da vida e começa a força-lo. No começo parecia que ia ser fácil, mas de repente ele sente uma força se opondo a dele. O garoto estava resistindo assim como Mirian havia o alertado. Lucas usa sua força e sente o garoto cedendo. Parecia que tudo ia acabar ali, quando a força oposta se intensificou ainda mais.

O anjo da guarda havia entrado em ação. Lucas percebeu que junto com seu humano aquele anjo tinha tudo para vencê-lo.

A batalha começa, Lucas se esforça, mas sua energia parece insuficiente. Ele a sente se esvaindo, a alma do garoto se fixa cada vez mais naquele corpo, e Lucas sente seu espirito sendo forçado para fora do garoto. Ele tenta romper o fio da vida de uma só vez, mas não consegue, e então é arremessado para longe.

Lucas abre os olhos, está caído no fundo da ambulância. Ele se levanta.

- Eu disse que você não iria leva-lo. – O anjo diz enquanto caminha na direção de Lucas. Ele fecha o punho direito e projeta um soco contra o rosto do ceifeiro...

Uma mão surge e segura o punho do anjo impedindo o soco, e então o arremessa para o outro lado da ambulância. Ele cai, e levanta o rosto para ver...

“Mirian”.

- O que faz aqui? – O anjo pergunta enquanto se levanta.

- Eu que pergunto Vertígo. O que você pensa que está fazendo atacando outro anjo?

- Ele pretendia levar o meu humano.

- Essa é a função dele seu idiota.

- Não me interessa. – Vertígo corre contra Mirian para ataca-la. Ela levanta a mão com a palma aberta e ele bate em uma parede invisível.

- O que você está fazendo?

- Estou te dando uma lição. Anjos são proibidos de atacar uns aos outros seu idiota. – Mirian olha para Lucas – Eu já volto. – E então some no ar junto com Vertígo.

Alguns instantes depois Mirian retorna.

- Aonde você foi?

- Levei aquele idiota para o Joseph.

- Por quê?

- Porque a lei do céu proibi que anjos ataquem uns aos outros. E aquele idiota atacou dois anjos em menos de um minuto.

- E por que ele me atacou?

- Porque ele é um anjo novo e esse é seu primeiro humano. Não é incomum anjos da guarda se apegarem demais ao seu primeiro humano e quando isso acontece eles podem acabar ficando violentos.

- Se não é incomum por que você o levou para o Joseph?

- Primeiro porque é o que a lei do céu manda fazer. Segundo porque se eu o aliviasse isso acabaria tornando a acontecer.

- E o que vai acontecer com ele agora?

- Joseph vai informar o superior dele, que por sua vez irá puni-lo devidamente. Sem falar que isso vai para a ficha dele e por isso ele irá demorar mais para ser promovido. Agora vamos embora.

- E o garoto?

- Ele ficará bem. Como você falhou em leva-lo ele ficará vivo por mais um tempo, até que seja a hora dele novamente.

- Certo.

Os dois somem no ar novamente

***

Lucas da um gole em sua bebida, depois repousa seu copo sobre o balcão. Ele e Mirian estavam sentados lado a lado no bar de João.

- Me diga uma coisa Mirian. Como você sabe exatamente quem deve ser ceifado?

- Eu tenho a lista de todas as pessoas a serem ceifadas dentro da minha cabeça.

- Como assim?

- Todo ceifeiro recebe a lista quando completa seu treinamento. Você também vai recebê-la quando estiver pronto.

- E depois?

- Depois você vai saber exatamente quem, onde e quando ceifar sem mim.

Lucas fica um pouco triste com aquela informação. Ele e Mirian estavam convivendo constantemente e ele não queria perder aquilo. Ela nota a expressão dele, mas antes que perguntasse ele a interrompe.

- E como foi que você conseguiu parar o Vertígo daquela forma?

- É que anjos tem poder. O grau de poder depende do seu desenvolvimento espiritual. Como eu sou bem mais desenvolvida que o Vertígo, o meu poder é muito maior que o dele. É por isso que foi fácil para mim detê-lo.

- Compreendo. Mas me diga, mais desenvolvida quanto?

- Ele é um anjo há três anos.

- E você?

- Há duzentos anos.

Lucas fica completamente surpreso com aquilo.

- Eu não esperava que você estivesse aqui há tanto tempo.

Mirian começa a rir.

- E quantos anos você tinha quando morreu?

- Dezessete.

- A mesma idade que eu.

- Sim.

Lucas se sente feliz em saber que ele e Mirian tinham a mesma idade, pelo menos na teoria. Apesar de adorar estar com sua tutora, Lucas começava a sentir o cansaço de sua missão.

- Vou embora Mirian. Preciso descansar antes da próxima missão.

- Eu imaginei que sim. Quando estiver pronto nós nos encontramos aqui.

- Está bem. Até mais.

- Até. E fique com Deus.

- E você com ele.

POR VINÍCIUS VIEIRA DE FARIA

EM 08/02/2015.